Processo
004/2022
Relator
Dra. Marilene Camate
Primeiro Adjunto
Dr. Lourenço José
Segundo Adjunto
Dra. Tânia Brás
Descritores:
Acórdão. Recurso de Apelação. Acção Declarativa de Condenação. Revogada a sentença recorrida.
I- A prescrição é a forma de extinção de um direito pelo seu não exercício por um dado lapso de tempo fixado na lei, e variável de caso para caso; só se encontram excluídos da prescrição os direitos indisponíveis e aqueles que a lei expressamente isenta dela (como acontece com os direitos de propriedade, uso, habitação, usufruto, superfície e servidão) artigo 298.º, nºs 1 e 3 C.C.
II- Se forma caso julgado quando uma decisão judicial adquir força obrigatória, por dela não se poder já reclamar nem recorrer por via ordinária. Não tendo a sentença recorrida transitado em julgado e o apelante manifestado a sua pretensão dentro do prazo legal, não procede a exceção do caso julgado por força do disposto no art.º 497º nº 1, parte final do C.P.C.
III- A litigância de má-fé configura-se no facto da parte deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso da lei, ou facto incontroverso:
- Alterar a verdade dos factos.
- Usar do processo para conseguir objectivo ilegal.
- Opor resistência injustificada ao andamento do processo.
- Proceder de modo temerário em qualquer incidente ou acto do processo.
- Provocar incidentes manifestamente infundados ou, ainda interpor recurso com intuito manifestamente prolatório da eleição dessas circunstancias decorre das obrigações anteriormente explicitadas pelas próprias normas de processo civil, que exigem da parte o dever de expor os factos conforme a verdade.
- Proceder com lealdade e boa-fé, não formular pretensões, nem alegar defesa, ciente de que são destituídas de fundamento.
- Não produzir provas, nem praticar actos inúteis ou desnecessários á declaração ou defesa do direito e cumprir com exactidão os provimentos judiciais, de natureza antecipada ou final.
Processo:
004/2022
Relator:
Desembargador Marilene Camate.
Data
do acórdão: 06 de Setembro de 2022.
Votação:
Unanimidade.
Meio
processual: Apelação.
Decisão: Revogada
a sentença recorrida.
Palavras-chaves:
Excepção
da prescrição;
Excepção do caso
julgado;
Litigância
de má-fé;
Condenação
a título de rendas.
Sumário
do acórdão.
I- A prescrição é a forma de extinção de um direito pelo seu não exercício por um dado lapso de tempo fixado na lei, e variável de caso para caso; só se encontram excluídos da prescrição os direitos indisponíveis e aqueles que a lei expressamente isenta dela (como acontece com os direitos de propriedade, uso, habitação, usufruto, superfície e servidão) artigo 298.º, nºs 1 e 3 C.C.
II- Se forma caso julgado quando uma decisão judicial adquir força obrigatória, por dela não se poder já reclamar nem recorrer por via ordinária. Não tendo a sentença recorrida transitado em julgado e o apelante manifestado a sua pretensão dentro do prazo legal, não procede a exceção do caso julgado por força do disposto no art.º 497º nº 1, parte final do C.P.C.
III-
A litigância de má-fé configura-se no
facto da parte deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso da lei, ou
facto incontroverso:
- Alterar a verdade dos
factos.
- Usar do processo para
conseguir objectivo ilegal.
- Opor resistência
injustificada ao andamento do processo.
- Proceder de modo
temerário em qualquer incidente ou acto do processo.
- Provocar incidentes
manifestamente infundados ou, ainda interpor recurso com intuito manifestamente
prolatório da eleição dessas circunstancias decorre das obrigações
anteriormente explicitadas pelas próprias normas de processo civil, que exigem
da parte o dever de expor os factos conforme a verdade.
- Proceder com lealdade e
boa-fé, não formular pretensões, nem alegar defesa, ciente de que são
destituídas de fundamento.
- Não produzir provas, nem
praticar actos inúteis ou desnecessários á declaração ou defesa do direito e
cumprir com exactidão os provimentos judiciais, de natureza antecipada ou
final.
ACÓRDÃO
Os
Juízes da 1ª secção da Camara do Cível, Contencioso Administrativo, Fiscal
Aduaneiro, Trabalho, Família e Justiça Juvenil do Tribunal da Relação do
Lubango, acordam em nome do Povo.
I. RELATÓRIO
Na
sala do Cível, Administrativo, Família e Trabalho, do Tribunal da Comarca do
Lubango, Requerente. A, solteiro, (…) de idade, natural de Quipungo,
Província da Huíla, residente (…), (…), intentou contra a Requerido. C, representada pelo socio
gerente Requerido. C1, com sede (…), município do Lubango, a presente
acção Declarativa de Condenação,
aduzindo, para tal, os seguintes fundamentos:
1. O
Requerente. A. é legitimo
proprietário de um armazém sito no mercado do (…) com a dimensão de 20 x15 metros e o Requerido. C exerce actividade comercial de vendas de mercadorias
diversa.
2. A
01 de Agosto de 2013 Requerente. A e
Requerido. C celebraram um contrato
de cavalheiros, de arrendamento do imóvel, pondo de parte, a redução a escrito
pelo facto de serem amigos.
3. Pelo
arrendamento ficou acordado uma renda mensal no montante em kwanza ao cambio do
dia USD 1.500,00 (Mil e quinhentos dólares americanos).
4. O
Requerido. C pediu ao Requerente. A, que lhe permitisse
colocar a mercadoria no armazém e posteriormente fazer o pagamento das
referidas mensalidades, Requerente. A
deu-lhe a chave do armazém e passou a exercer com regularidade a sua
actividade.
5. Passados
quase dois meses o Requerente. A.
entrou em contacto com Requerido. C,
por via telefónica perguntando sobre o pagamento das rendas que ainda não
haviam sido pagas, tendo o Requerido. C
efectuado o pagamento do valor de Akz 472.500,00 (Quatrocentos e setenta e dois
mil e quinhentos kwanzas) referente aos meses de Setembro, Outubro, Novembro e
Dezembro de 2013.
6. Em
Junho de 2014 o Requerente. A
telefonou ao Requerido. C para se
inteirar sobre as rendas em atraso, o Requerido.
C respondeu que não tinha dinheiro e que a mercadoria em armazém estava
caducada.
7. Estando
em falta 12 meses, que perfaz o valor em Akz 1.650.000,00 (Um milhão seiscentos
e cinquenta mil kwanzas).
8. Interpelado
extrajudicialmente para efeito de reparar o dano, o Requerido. C, encapuçado de má fé nega pagar as rendas em atraso.
9. O
Requerente. A passa por revés
financeiro em virtude do incumprimento do Requerido.
C.
Termina
pedindo que recebida a presente Petição Inicial, a Ação seja considerada
procedente e provada, e o Requerido. C.
condenado no pedido.
Juntou
procuração forense e documentos de fls. 8 a 17 dos autos.
Devidamente
citado o Requerido. C contestou a
fls.21, por excepção e por impugnação, referindo em síntese o seguinte:
Por Excepção.
1. O
Requerido. C vem indicado na PI como
sócio da empresa (…), o que não
corresponde à verdade.
2. O
armazém do autor, foi localizado pelo Requerido.
C. à pedido do representante da empresa, para arrendamento e deposito de
mercadoria.
3. O
Requerido. C em momento algum se
identificou como representante da empresa e por esse motivo não celebrou nenhum
contrato escrito com o Requerente. A
por lhe faltar legitimidade para o efeito.
4. Por
este facto o Requerido. C se
considera parte ilegítima nesta ação porque lhe falta o exigido interesse
directo em contradizer qual demandado, nos termos do artigo 26° do C.P.C, por
não ser a pessoa que juridicamente pode se opor a pretensão do Requerente. A
5. Estará
investida desta posição a empresa (…),
titular da mercadoria armazenada, e com o conhecimento, bem como anuência do Requerente. A
Por impugnação.
1- Assim
por acordo com a empresa, decidiu em Dezembro de 2013, proceder ao pagamento
das rendas correspondentes aos meses de Agosto á Dezembro de 2013, com o
produto da venda da mercadoria que se encontrava em sua casa. Vide cópia de
cheque em anexo, passado á ordem da empresa do Requerente. A.
2- O
Cheque foi passado com o valor de Akz472.500,00 (Quatrocentos e setenta e dois
mil e quinhentos kwanzas), ficando acordado que o remanescente seria compensado
com o valor de 500 caixas de águas retiradas pelo Requerente. A. da mercadoria da empresa, correspondendo a Akz.225.000,00
(Duzentos e vinte e cinco mil kwanzas).
3- A
empresa voltou a não cumprir com o acordo pelos meses de Janeiro e Fevereiro,
assim por insistência do Requerido. C
a empresa retirou a sua mercadoria do armazém do Requerente. A no final de Fevereiro, e acordou que o produto da
venda da restante mercadoria em posse do Requerido.
C fosse entregue ao Requerente. A
para o Pagamento das rendas dos meses em questão.
4- Quando
o Requerente. A insistiu que deveria
ser pago também o mês de Março, o Requerido.
C. com a anuência da empresa procedeu ao pagamento de mais Akz 510.000,00
(Quinhentos e dez mil Kwanzas), para as referidas rendas. Depósito realizado na
conta da empresa do Requerente. A, (…).
5- Acontece,
porém, que por má-fé do A., mesmo depois de investidas do Requerido. C. a Partir de Março de 2014 para a entrega das chaves,
este sempre se negou a receber a chave do armazém, tendo acontecido apenas em
Julho de 2014, quando perante a policia as chaves foram entregues ao Requerente. A facto que põe em cheque o
pedido mesmo para o pagamento de rendas do ano de 2014.
6- Pedido
inconcebível porque a mercadoria foi retirada do local em Fevereiro de 2014 e a
única chave que o Requerido. C
recebeu foi entregue ao Requerente. A.
em Julho de 2014, por ganância deste.
7- Quanto
aos articulados 8° e 9° não correspondem a verdade porque o Requerente. A. não realizou actividade
comercial no armazém, a mercadoria foi lá depositada e lá ficou sendo retirada
apenas pela empresa quando lhe apetecesse.
8- O
Requerido. C realiza comércio na sua
própria casa e nunca o fez no referido armazém.
9- A
empresa (…) retirou toda mercadoria
do armazém no final de Fevereiro de 2014, o Requerido. C com muita insistência procurou o Requerente. A para a entrega das chaves, mas este se negou a
receber.
10- Assim,
o contrato verbal deixou de vigorar naquele mês, no entanto o Requerido. C ainda procedeu o
pagamento, por insistência do Requerente.
A, da renda correspondente ao mês de Março, mas não pode concordar em pagar
mais algum mês, o que seria uma verdadeira injustiça.
11- Não
poderão estar em divida as rendas de todos os meses de 2014, porque a
mercadoria foi completamente retirada do armazém em Fevereiro de 2014 e por
má-fé do Requerente. A, as chaves
lhe foram entregues no mês de Julho de 2014.
12- Acresce-se
a isso o facto de que as rendas, conforme comprovativos de pagamento a empresa
do Requerente. A, a (…), foram pagas até ao mês de Março de
2014, não havendo razões para a continua cobrança.
13- Quem
deverá indemnizar por alguma coisa será o Requerente.
A por litigância de má-fé.
Termina
pedindo a improcedência da acção e que seja julgada procedente a excepção da
ilegitimidade ou procedente a excepção perentória do cumprimento da obrigação e
ainda, a condenação do autor por litigância de má fé.
Junta
a procuração forense e duplicados legais de fls. 31 a 34
Conclusos
os autos, foi proferido o Despacho Saneador de fls.45 verso.
Proferida
sentença, foi o réu absolvido do pedido e o Requerente. A condenado por litigância de má fé e na consequente
indemnização.
Inconformado
o Requerente. A com a sentença, veio
este interpor recurso a fls.85, admitido a fls. 106 verso.
Pagas
as custas os autos subiram a esta instância.
O Apelante
ora recorrente, veio apresentar alegações de recurso com as seguintes conclusões:
1. Não
entende, as razões que motivaram o Tribunal "a
quo" a condena-lo em litigância de má fé e a absolver o Requerido. C do pedido.
2. O apelante
em momento algum agiu com dolo, pois sabia que o apelado devia 12 meses de renda, por isso, entende que o Tribunal "A Quo", andou mal, medida em
que ficou provado que o pagamento foi apenas até ao mês de Março de 2014 e que
as chaves foram entregues apenas no mês de Junho do mesmo ano.
3. A
verbalidade enquanto, declaração negocial é pratica reiterada, na nossa realidade
e que o formalismo pouco ou nada se vê nos negócios Jurídicos.
Contra-alegando a fls. 160 a 162,
veio o Apelado apresentar, em suma, o seguinte:
1. A
lide constituída em sede da acção acima mencionada decorreu há mais de dois
anos, tendo o tribunal "a quo"
decidido definitivamente sobre o caso no dia 27 de Janeiro de 2020.
2. A
decisão proferida pelo tribunal "a
quo" já transitou em julgado e, não está disponível para recurso
ordinário.
3. O apelante
perdeu o direito de recorrer por aceitação tácita da decisão depois de
proferida.
4. Os
factos apresentados pelo apelante no
presente recurso, já foram suficientemente discutidos em 1° instância, tanto
mais que o Tribunal proferiu uma sentença justa e conforme a lei.
5. Sobre
os factos, o apelado remete-se as
provas produzidas pelo tribunal “a quo”,
todavia, realça que teve os atrasos referidos nos articulados 13° e 140 das
alegações de recurso, porque o apelante
quis receber as chaves, numa altura em que já não precisava do armazém;
6. Foi
necessária a intervenção de agentes de autoridade para receber as chaves.
Termina
pedindo o indeferimento do presente recurso por ser extemporâneo e se julgue
procedente a excepção peremptória de prescrição;
Foram
os autos com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público a fis. 173.
Colhidos
os vistos, cabe apreciar o objecto do recurso:
II. OBJECTO DE RECURSO
O
âmbito do objecto de recurso afere-se e se delimita pelas conclusões formuladas
na respectiva motivação, sem prejuízo da matéria de conhecimento oficioso
(artigos 660°, n° 2; 664º; 684°, n° 3 e 691°, n° 1 e n° 3, todos do C.P.C),
assim, emerge como questões a apreciar:
- Saber se a excepção da prescrição
procede.
- Saber se a excepção do caso julgado
precede.
- Saber se deve o apelado ser
condenado a pagar 1.650.000,00Kz (Um milhão e seiscentos e cinquenta mil
kwanzas) a titulo de rendas.
- Saber se o apelante deve ser
condenado por litigância de má-fé no pagamento da indemnização de kz:
300.000,00 (Trezentos Mil Kwanzas) ao Apelado.
III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com
relevância para a decisão da causa, o Tribunal a quo dá como provados os
seguintes
factos;
-
O Requerente. A é proprietário de um
armazém, sito no mercado do Mutundo.
-
Requerente. A e o réu celebraram um
contrato verbal de arrendamento de imóvel.
-
As partes estipularam uma renda mensal no valor de USD.1.500,00, no seu
equivalente em kwanzas ao câmbio do dia;
-
O referido contrato foi celebrado no dia 01 de Agosto de 2013.
-
O pagamento das rendas dos meses de Setembro a Dezembro de 2013 no valor de
Akz.
472.500,00Kz,
foi efectuado mediante transferência bancária para a conta do Requerente. A.
-
O Requerido. C pagou as rendas de
Janeiro, Fevereiro e Março do ano de 2014.
-
O Requerido. C devolveu as chaves do
imóvel ao autor em Junho de 2014.
IV. APRECIANDO
Das
questões objecto do presente recurso, importa verificarmos o seguinte:
1. Saber se procede a excepção do
caso julgado.
O
apelado vem excepcionar dizendo, que
o tribunal de primeira instância já condenou o apelante por sentença já transitada em julgado e que a lide constituída
em sede da acção já decorreu a mais de dois anos, tendo sido decidida
definitivamente em 27 de Janeiro de 2020, e que o apelado tinha 8 dias para interpor recurso, assim a decisão
transitou em julgado não estando disponível para recurso ordinário.
Mesmo
que o apelado não arguisse a
presente excepção, ela é do conhecimento oficioso conf. art.º 500º C.P.C.
Ora
vejamos:
O apelado
foi notificado da decisão no dia 11 de Fevereiro de 2020, conforme fls.83 e
interpôs recurso no dia 18 de Fevereiro de 2020, fis. 85, isto é dentro do
prazo legal de 8 dias, a contar da data da notificação.
Ana
Prata, in Dicionário jurídico, refere que "se forma caso julgado quando
uma decisão judicial adquiri força obrigatória, por dela não se poder já
reclamar nem recorrer por via ordinária".
No
caso em apreço, a decisão recorrida não faz caso julgado, exactamente pelo
facto de a sentença proferida a 27 de Janeiro de 2020, não ter transitado em
julgado, porque o recurso foi interposto tempestivamente, conforme nota de revisão
de folhas.141 dos autos.
Decidindo:
Não
tendo a sentença recorrida transitado em julgado e o apelante manifestado a sua
pretensão dentro do prazo legal, não procede a exceção do caso julgado por
força do disposto no art.º 497º nº 1, parte final do C.P.C.
2- Saber se procede a excepção da
prescrição?
Vem
o apelado dizer que o recurso é
extemporâneo e que os factos apresentados pelo apelante já foram discutidos em 1° instancia, e sobre eles já
existe uma sentença justa, tanto que remete ás provas produzidas pelo tribunal
a quo", e por essa razão deve ser julgado prescrito.
Ana
Prata, in Dicionário Jurídico, “A prescrição é a forma de extinção de um
direito pelo seu não exercício por um dado lapso de tempo fixado na lei, e
variável de caso para caso; só se encontram excluídos da prescrição os direitos
indisponíveis e aqueles que a lei expressamente isenta dela (como acontece com
os direitos de propriedade, uso, habitação, usufruto, superficie e servidão)
artigo 298.º, nºs 1 e 3 C.C.
Dos
fundamentos aduzidos pelo apelado,
verifica-se que são os mesmos utilizados na arguição da excepção do caso
julgado, já acima apreciado.
Decidida
já a improcedência da excepção do caso julgado, não é de invocar a excepção da
prescrição do direito de recorrer.
3- Saber se o apelante deve ser
condenado por litigância de má-fé no pagamento da indemnização de kz:
300.000,00 (Trezentos Mil Kwanzas) ao Apelado.
Apreciando:
O
apelante vem dizer que celebrou um
contrato verbal de arrendamento comercial, onde o mesmo deu de arrendamento o
seu armazém sito no bairro do Mutundo, ao apelado,
e desse contrato resultou o não pagamento de rendas correspondente a 12 meses,
no valor de 1.650.000,00 (Um milhão e seiscentos e cinquenta mil kwanzas).
Ora
vejamos:
Antes
de apreciar as rendas em divida há que verificar se o contrato é ou não valido.
Dispõe
o art.º 10º n.º 1 a) do Decreto Lei 43.525, em vigor à data da celebração do
contrato, o seguinte:
Devem
ser reduzidos a escritura pública:
a) Os
arrendamentos sujeitos a registo.
b) Os
arrendamentos para comércio ou indústria.
c) Os
arrendamentos para o exercício de profissão liberal.
d) Os
arrendamentos tomados por quaisquer corporações, fundações, associações ou
agremiações de utilidade pública, particular, legalmente organizados.
Igual
entendimento encontra-se na nova lei do Arrendamento urbano, lei n° 26/15 de 23
de Outubro, ao dispor no artigo 8° n° 2 alínea b) que os arrendamentos de
comércio, indústria ou exercício de profissão liberal devem ser reduzidos a
escritura pública.
O
legislador continua a salvaguardar a observância de Escritura Pública como
requisito de validade do arrendamento para comércio.
Decidindo:
O
contrato não celebrado na forma prescrita por lei é nulo, vide art.º 220º do
Código Civil.
Nos
termos do artigo 289º nº 1, a nulidade do negocio tem efeito retroativo,
devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado.
4-
Saber
se o apelante deve ou não ser condenado em litigância de má-fé, e no pagamento
ao Apelado de uma indemnização de kz: 300.000,00 (Trezentos Mil Kwanzas)?
O
apelante não entende que por que
razão foi condenado em litigância de má fé, porquanto em momento algum agiu com
dolo, pois sabia que o apelado devia
doze meses de renda, porque o pagamento foi feito até ao mês de Março de 2014,
e que as chaves foram entregues apenas no mês de Junho de 2014.
Apreciando:
O
Acórdão Do Tribunal Supremo De Angola, de 9 de Maio de 2019. A litigância de
má-fé configura-se no facto da parte deduzir pretensão ou defesa contra texto
expresso da lei, ou facto incontroverso:
-
Alterar a verdade dos factos.
-
Usar do processo para conseguir objectivo ilegal.
-
Opor resistência injustificada ao andamento do processo.
-
Proceder de modo temerário em qualquer incidente ou acto do processo.
-
Provocar incidentes manifestamente infundados ou, ainda interpor recurso com
intuito manifestamente prolatório da eleição dessas circunstancias decorre das
obrigações anteriormente explicitadas pelas próprias normas de processo civil,
que exigem da parte o dever de expor os factos conforme a verdade.
-
Proceder com lealdade e boa-fé, não formular pretensões, nem alegar defesa,
ciente de que são destituídas de fundamento.
-
Não produzir provas, nem praticar actos inúteis ou desnecessários á declaração
ou defesa do direito e cumprir com exactidão os provimentos judiciais, de
natureza antecipada ou final.
Dessa
forma qualquer conduta que ultrapasse esse limite, será considerada temerária e
implicara nas consequências previstas na lei Processual Civil, que autoriza o
juiz ou o Tribunal, de oficio ou a requerimento, condenar o litigante de má-fé
ao pagamento de multa e indemnização nos termos da lei.
Pelo
comportamento do Apelante nos autos
não se depreende a litigância de má-fé decorrente das não comprovadas
vicissitudes constantes na pretensão do apelado.
Ora
vejamos:
"A
simples proposição da acção ou contestação, embora sem fundamento, não
constitui dolo, porque a incerteza da lei, a dificuldade de apurar os factos e
de os interpretar, podem levar as consciências mais honestas a afirmar um direito
que não possuem e a impugnar uma obrigação que devessem cumprir, é preciso que
o réu ou o autor faça um pedido a que conscientemente sabe não ter direito, e
que o réu contradiga uma obrigação a que sabe conscientemente sabe que deve
cumprir. ALBERTO DOS REIS, IN CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, VOL. II 3°
ED.1948"
Entende-se
existir uma linha tênue, que separa a má fé do direito das partes em proporem
os seus pontos de vista, convictos de que têm razão.
Atento
ao caso, cremos não ser de manter tal decisão, considerando-se, contrariamente
ao juízo sobre tal matéria desenvolvido pelo tribunal de 1° instância, que a
aludida litigância de má fé não resulta provada, nem se manifesta nos autos,
não se demonstrando qualquer actuação dolosa ou gravemente negligente do apelante, com vista a conseguir um
objectivo ilegal, a impedir a descoberta da verdade, ou a entorpecer a acção da
justiça, não decorrendo a verificação de actuação de litigância de má fé, por
si só, da circunstancia de a parte ter cometido um erro nos cálculos de rendas
em divida.
No
art.º 457º nº1, CPC a indemnização por litigância de ma fé, deve haver um nexo
de causalidade entre os factos e os danos causados, ou seja a litigância dolosa
com as despesas efectuadas em termos de honorários e outras despesas
processuais (taxa de justiça e encargos) contudo, em qualquer dessas situações
nos encontramos perante uma intenção maliciosa ou uma negligencia de tal modo
grave ou grosseira que, aproximando-a da actuação dolosa, justifica um elevado
grau de reprovação e idêntica reação punitiva.
V.
DECISÃO
Nestes termos e fundamentos, acordam
os juízes da 1º secção desta câmara, em julgar procedente a apelação, e
revogando-se a decisão recorrida.
Custas
pelo apelado.
Registe
e Notifique.
Lubango,
6 de Setembro de 2022.
Os juízes Desembargadores
Marilene Camate-Relatora
Lourenço José-1º Adjunto
Tânia Brás-2º Adjunta