Processo
008/2022-CIV3-H
Relator
Dr. Bartolomeu Hangalo
Primeiro Adjunto
Dra. Marta Ngueve
Segundo Adjunto
Dr. Domingos Nahanga
Descritores:
Acórdão. Recurso de Agravo. Acção de Despejo. Confirmada a decisão recorrida.
ACÓRDÃO
Recurso
nº 008/2022-CIV3-H
Os
Juízes da 2ª Secção da Câmara do Cível do Tribunal da Relação do Lubango, reunidos
em conferência, em nome do povo, acordam:
I
– RELATÓRIO
Na
Sala do Cível e Administrativo do então Tribunal Provincial da Huíla, hoje,
Tribunal de Comarca do Lubango, AA, casado, intentou a presente ACÇÃO DE
DESPEJO que fez seguir contra a BB, na pessoa do seu representante
legal, pedindo a procedência da acção e, em consequência:
a)
Ser
decretada a cessação do arrendamento por resolução com a condenação da R., na
entrega do locado, livre e devoluto;
b)
Ser
a R. condenada no pagamento das rendas vencidas e não pagas, no valor de
3 120 000,00 Kz (Três Milhões, Cento e Vinte Mil Kwanzas), desde
Setembro de 2015 até à efectiva entrega do locado;
c)
Ser
a R. condenada no pagamento da quantia de 3 919 500,00 Kz (Três
Milhões, Novecentos e Dezanove Mil, Quinhentos Kwanzas), correspondentes aos
juros de mora já vencidos, à taxa legal de 75% ao ano, desde 1 de Setembro de
2015 a 31 de Maio de 2017 e
d)
Vincendos
até ao pagamento integral da dívida, a calcular, à taxa acima referida, nos
termos do Despacho Conjunto, nº 36/03, de 25 de Abril, conjugado com o art.
509º do Código Civil actualizado.
Para
sustentar o seu pedido, alegou que:
É
proprietário de um prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana do Lubango,
sob o nº 2.571, que, em Abril de 2013, deu de arrendamento para escritório da
R. por contrato celebrado por um prazo de 5 (cinco) anos, com início em 1 de Abril
de 2013 e término em 1 de Abril de 2018, com uma renda mensal no valor
equivalente em Kwanzas a 750,00 USD (Setecentos e Cinquenta Dólares
Norte-Americanos), paga até ao dia 30 do mês a que disser respeito, ao câmbio
do dia no momento do pagamento;
A R. deixou de pagar as rendas mensais desde o
mês de Setembro de 2015, totalizando o valor em débito a quantia equivalente a 15 000,00
USD (Quinze Mil Dólares Norte-Americanos) que correspondem a
3 120 000,00 Kz (Três Milhões, Cento e Vinte Mil Kwanzas) ao câmbio
do dia.
Constituiu
advogado e juntou documentos.
Por
carta precatória, a R. foi citada em Luanda, no dia 11 de Julho de 2018 – fls.
47;
Por
falta de contestação, foi ordenado o cumprimento do disposto no art. 484º do
Código de Processo Civil (C.P.C.) – fls. 52.
Em
seguida foi proferida sentença a julgar “procedente o pedido de despejo e
entrega do imóvel arrendando livre e devoluto”;
Julgou
“ainda procedente o pedido cumulado de pagamento de rendas vencidas e
vincendas desde Setembro de 2015 até Abril de 2018 (Abril inclusive) com o
consequente pagamento de juros de mora, calculados à taxa legal, devidos desde
a data dos respectivos vencimentos”.
Notificada
da sentença, inconformada, a R. interpôs recurso de agravo (fls. 81), que foi
admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito
suspensivo – fls. 96.
A
Recorrente apresentou as suas alegações de recurso (fls. 101-104), com as
seguintes conclusões:
1.
O
acto da citação da apelante foi irregular, com violação do disposto no nº 3 do
art. 228º do C.P.C., por se ter entregue apenas a petição inicial sem as cópias
dos documentos e peças do processo relacionados com os factos e necessários à
plena compreensão do objecto da acção;
2.
A
falta de entrega no acto da citação por carta precatória, dos documentos e
peças do processo necessárias à plena compreensão do objecto de acção, não
permitiu a apelante munir-se de elementos necessários à sua defesa e violou o
princípio do contraditório consagrado no nº 3 do art. 3º C.P.C;
3.
A
sentença recorrida contrariou o imperativo constitucional dos princípios do
contraditório, previsto no nº 2 do art. 174º e da legalidade do art. 72º, ambos
da Constituição da República de Angola;
4.
As
referidas violações têm como consequência directa e imediata a nulidade da
citação, ao abrigo do nº 1 do art. 198º do C.P.C. e de todo o processado
posterior à citação incluindo a sentença, nos termos do nº 1 e nº 2 do art.
201º do C.P.C.
O
Recorrido contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida – fls.
108-110.
Remetidos
os autos ao Tribunal ad quem, este, em estrita observância do disposto
nos artigos 701º e 702º do C.P.C. levou o processo à conferência na qual foi
proferido acórdão datado de 27 de Abril de 2022, a alterar a espécie de recurso,
passando a tramitar como agravo – fls. 130 – facto que foi devidamente notificado
às partes no dia 10 de Maio de 2022 – fls. 136 e 137.
No
mais, foi mantido o regime de subida e o efeito atribuído ao recurso.
Os
autos foram com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público, que, no seu
visto legal, nada requereu e pronunciou-se no sentido de se negar provimento ao
recurso por não se verificarem a nulidade e as irregularidades invocadas pela
Agravante – fls. 140-143.
Colhidos
os vistos legais, importa apreciar e decidir:
II
– FACTOS PROVADOS
Com
relevância para a decisão do agravo, de forma cronológica, são os seguintes os
factos provados:
1. O Autor, ora Recorrido, em 19 de Maio de 2017, intentou contra a Ré, ora Recorrente, uma acção especial de despejo, pedindo a procedência da acção e, em consequência, ser decretada a cessação do arrendamento por resolução com a condenação da R., na entrega do locado, livre e devoluto; ser a R. condenada no pagamento das rendas vencidas e não pagas, no valor de 3 120 000,00 Kz (Três Milhões, Cento e Vinte Mil Kwanzas), desde Setembro de 2015 até à efectiva entrega do locado; ser a R. condenada no pagamento da quantia de 3 919 500,00 Kz (Três Milhões, Novecentos e Dezanove Mil, Quinhentos Kwanzas), correspondentes aos juros de mora já vencidos, à taxa legal de 75% ao ano, desde 1 de Setembro de 2015 a 31 de Maio de 2017 e vincendos até ao pagamento integral da dívida, a calcular, à taxa acima referida, nos termos do Despacho Conjunto, nº 36/03, de 25 de Abril, conjugado com o art. 509º do Código Civil actualizado – fls. 3-5.
2. A petição inicial fez-se acompanhar de documentos, tais como o contrato de arrendamento, cálculo do valor patrimonial do imóvel, termo de quitação, guia de pagamento do imóvel, cópia do bilhete de identidade do Autor, caderneta predial urbana, três certidões passadas pela Repartição Fiscal do Lubango, cartão de contribuinte do Autor, extracto de conta bancária do Autor, taxa de câmbio do Banco -----, referente ao dia 22 de Maio de 2017 – fls. 7-8; 9; 10; 11; 12; 13-14; 15-17; 18; 19-20 e 21.
3. A Ré foi citada por carta precatória no dia 11 de Julho de 2018, tendo sido emitida certidão em que se certifica e se dá fé que foi “citada para no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data da citação, contestar, querendo a Acção de Despejo Imediato, em que é Requerente AA, sob pena de não o fazendo, com a advertência de que a falta de contestação importa a confissão dos articulados pelo autor, tudo como melhor consta do duplicado da petição inicial que neste acto lhe entreguei, com a respectiva nota legal. E de tudo me declarou ficar bem ciente e como recebeu o referido duplicado e nota legal”. – fls. 47
4. Por falta de contestação, em 24 de Abril de 2019, foi proferido despacho a ordenar o cumprimento do disposto no art. 484º do Código de Processo Civil (C.P.C.) – fls. 52.
5. Em cumprimento do ordenado, em 4 de Junho de 2019, o Autor apresentou as suas alegações escritas – fls. 57-59
6. Em 12 de Setembro de 2019, foi proferida sentença em que foi decretada a revelia e, em consequência, a Ré condenada no pedido – fls. 61-64
7. No dia 29 de Julho de 2020, a Ré juntou aos autos procuração forense em que constitui mandatário judicial – fls. 76-77.
8. E no dia 6 de Outubro de 2020, a Ré foi notificada da sentença por meio dos seu mandatário judicial constituído – fls. 80.
9. No dia 7 de Outubro de 2020, a Ré veio interpor recurso de agravo – fls. 81.
10. O recurso foi admitido no dia 21 de Abril de 2021, como sendo de apelação com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo – fls. 96.
11. As partes foram notificadas do despacho de admissão do recurso, o Autor, no dia 17 de Maio de 2021 e a Ré, no dia 18 de Maio de 2021 – fls. 98 e 99.
12.
No
dia 24 de Maio de 2021, a Ré, ora Recorrente, deu entrada, ainda na primeira
instância, das suas alegações de recurso em que requer a revogação da sentença
e a sua absolvição da instância com fundamento na invocação de nulidade da
citação consubstanciada na alegação de que, no acto da citação por carta
precatória, lhe foi entregue apenas a petição inicial sem as cópias dos
documentos e peças do processo relacionadas com os factos necessárias à plena
compreensão do objecto da acção. – fls.- 101-104.
III
– OBJECTO DO RECURSO
O
âmbito e o objecto do recurso são delimitados, para além das meras razões de
direito e das questões de conhecimento oficioso, pelo inserto nas conclusões
das alegações (artigos 660º, nº 2; 684º, nº 3; 690º, nº 1, 713º, nº 2 e 749º,
todos do Código de Processo Civil.
Emergem,
assim, como questões a decidir, saber se:
1.
A irregularidade no acto da citação foi tempestivamente
arguida?
2.
A citação é nula?
3.
A sentença contrariou o imperativo constitucional dos
princípios do contraditório e da legalidade, previstos nos artigos 72º e 174º,
nº 2 da Constituição da República (CRA)?
IV
– FUNDAMENTAÇÃO
O
presente agravo assenta na alegação de que a citação foi feita com a simples
entrega do duplicado da petição inicial, sem os documentos que a acompanharam.
A Recorrente alega não se ter dado cumprimento ao disposto num pretenso nº 3 do
artigo 228º, do Código de Processo Civil (C.P.C.) com o seguinte teor: “a
citação e as notificações são sempre acompanhadas de todos os elementos e de
cópias legíveis dos documentos e peças do processo necessárias à plena
compreensão do seu objecto”.
Ocorre
que o art. 228º do Código de Processo Civil vigente em Angola depois da
independência, tem apenas 2 números e não comporta nenhum nº3. O conteúdo
transcrito no parágrafo que antecede foi retirado do Código de Processo Civil
vigente ou pelo menos que vigorou em Portugal onde, face à evolução legislativa
e às sucessivas alterações, ao artigo 228º do C.P.C. foram aditados dois
números: 3 e 4.
O
acabado de afirmar pode ser conferido no Código de Processo Civil Anotado de
Abílio Neto, 22ª Edição Actualizada, Novembro/2009, Ediforum, Edições Jurídicas,
Lda, Lisboa, pág. 361.
O nº 3 do referido Código de Processo Civil português
é que prescreve: “a citação e as notificações são sempre acompanhadas de
todos os elementos e de cópias legíveis dos documentos e peças do processo
necessários à plena compreensão do seu objecto”, conteúdo reproduzido nas
alegações de recurso da Agravante.
Porém,
é de referir que depois da independência, declarada aos 11 dias do mês de
Novembro de 1975, as leis portuguesas deixaram de ter aplicação imediata em
Angola.
Por
outras palavras, o disposto no nº 3 do art. 228º do Código de Processo Civil português
não é aplicável ao caso.
Afastada
a norma jurídica antes indicada e invocada nas alegações de recurso, passemos
então a analisar a primeira questão suscitada.
i/ - A irregularidade no acto da citação foi tempestivamente
arguida?
De
acordo com o nº 1 do art. 228º do C.P.C. “a citação é o acto pelo qual se dá
conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama
ao processo para se defender”.
Antunes
Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, no Manual de Processo Civil, pág. 266,
referindo-se à citação dizem que é o “acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que
foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se
defender (…) trata-se do acto que em obediência ao principio do contraditório
visa fechar o ciclo constitutivo da relação processual”.
E António
Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in Código
de Processo Civil Anotado, Vol. I – Parte Geral e Processo de Declaração, 2018,
pág. 251, afirmam que “quer pela forma, quer pelo seu conteúdo e finalidade,
a citação constitui o meio privilegiado para a concretização de um dos
princípios basilares do processo civil: o princípio do contraditório. Num
processo de natureza dialética, como é o processo civil, é a citação do réu que
determina o início da discussão necessária a iluminar a resolução do conflito
de interesses, com vista à justa composição do litígio. É pelo ato de citação
que se dá conhecimento ao réu da petição ou do requerimento inicial,
propiciando-lhe a faculdade de deduzir oposição.”
Uma tutela
jurisdicional efectiva de quem é chamado para se defender em um processo
judicial implica que tenha à sua disposição a informação necessária quanto à
acção e aos respectivos meios de prova.
No entender da Recorrente, terá existido uma irregularidade
comprometedora do seu direito de defesa, um caso de nulidade de citação, por
não lhe terem sido entregues os documentos que acompanharam a petição inicial.
Mas
antes de se aferir se de facto a alegada irregularidade, a existir, inquinou de
nulidade a citação, há que, primeiramente, saber se a sua arguição foi
tempestiva. E para tal, impõe-se fazer uma distinção entre os vícios de que a
citação pode padecer, pois diferente é também o regime e o momento de sua
arguição.
Encurtando
considerações, podemos distinguir dois grupos de vícios de que a citação pode
padecer:
a)
A falta de citação;
b)
E a nulidade da citação.
i.a/ - Falta de citação
A
falta de citação está prevista no art. 194º e caracterizada no art. 195º, ambos
do C.P.C.
Assim,
à luz do disposto no artigo 195º do C.P.C. :
“1. Há falta de
citação:
a)
Quando o acto tenha sido completamente omitido;
b)
Quando tenha havido erro de identidade do citado;
c)
Quando se tenha empregado indevidamente a citação
edital;
d)
Quando a citação tenha sido feita com preterição de
formalidades essenciais;
e)
Quando se mostre que foi efectuada depois do
falecimento do citando.”
Poder-se-ia
questionar, que formalidades essenciais, quando preteridas, dão lugar ou
equivalem à falta de citação?
A resposta é dada pelo próprio art.
195º do C.P.C.:
“2. São
formalidades essenciais:
a)
Na citação feita na pessoa do réu, a entrega do
duplicado e assinatura do citado na certidão ou a intervenção de duas
testemunhas quando o citado não assine;
…”
As formalidades a observar no acto da
citação feita na pessoa do réu, estão descritas no artigo 242º do C.P.C. “1.
Quando a citação é feita na pessoa do réu, o funcionário entrega-lhe o
duplicado da petição inicial e faz-lhe saber que fica citado para acção a que o
duplicado se refere, indicando-lhe o dia até ao qual pode oferecer a defesa e a
cominação em que incorre se a não oferecer. No duplicado lança uma nota em que
declara o dia da citação, o prazo marcado para defesa, a cominação e a vara ou
juízo e secção onde corre o processo, se já tiver havido distribuição. De tudo
lavrará certidão, que é assinada pelo citado.”
i.b/ - Nulidade da citação
Já a nulidade da citação está prevista
no art. 198º do C.P.C. cujo nº 1 dispõe
que “é nula a citação quando, observadas as formalidades essenciais, tenha
havido preterição de outras formalidades prescritas na lei”.
Não são os mesmos os efeitos
decorrentes de um ou de outro vício. A falta de citação acarreta a anulação de
tudo o que se processe depois da petição inicial, salvando apenas esta – art.
194º do C.P.C.
Já a nulidade da citação poderá não
resultar na anulação de nenhum acto, pois, nos termos do art. 198º, nº 2,
segunda parte, “a arguição só será atendida se a falta cometida puder
prejudicar a defesa do citado”.
i.c/ - Momento da arguição.
Quanto ao momento da sua arguição, a
falta de citação prevista e descrita nos art. 194 e 195º do C.P.C. é de
conhecimento oficioso e pode ser arguida em qualquer estado do processo
enquanto não dever considerar-se sanada, conforme dispõe o art. 204º, nº 2 do
C.P.C. E considera-se sanada se o réu intervier no processo sem arguir logo a
falta – art. 196º do C.P.C.
Por
seu turno, a nulidade da citação, prevista nos termos do art. 198º do C.P.C.,
só pode ser arguida no prazo da contestação. A este propósito veja-se o
disposto no nº2 do artigo antes mencionado: “o prazo para a arguição da
nulidade conta-se desde a citação”.
Dito
isto, cumpre agora verificar se a irregularidade da citação objecto do presente
recurso, versa sobre a falta de citação, prevista e descrita nos artigos 194º e
195º do C.P.C. ou se sobre a nulidade prevista nos termos do art. 198º do mesmo
C.P.C. para depois se decidir se a arguição é tempestiva ou não.
Nas
suas alegações de recurso, fls. 101-104, a Agravante não põe em causa e nem
invoca a omissão completa do acto de citação. Pelo contrário, reconhece
expressamente ter sido citado e que no acto da citação foi-lhe entregue a
petição inicial. Dito de outro modo, não está em causa a falta de citação.
De facto, e tal como se deu por
provado, consta nos autos, a fls. 47, uma certidão de citação que atesta que no
dia 11 de Julho de 2018, a então Requerida foi citada para no prazo de 30
(trinta) dias, a contar da data da citação, contestar, com a advertência
expressa de que a falta de contestação importa a confissão dos factos
articulados pelo autor.
Na mesma certidão de citação é atestado
que no acto foi-lhe entregue o duplicado da petição inicial, com a respectiva
nota legal.
Do exposto decorre que não se verifica
a falta de citação prevista e descrita nos artigos 194º e 195º do C.P.C. Esta
foi feita com a observância das formalidades essenciais e descritas no art.
242º do C.P.C. O Réu foi citado no dia 11 de Jullho de 2018, no acto da citação
foi-lhe entregue o duplicado da petição, foi-lhe assinalado prazo para
contestar (30 dias) e assinou a certidão de citação – fls. 47.
Assim, a existir alguma irregularidade
na citação esta só poderá circunscrever-se à nulidade prevista nos termos do
art. 198º do C.P.C. De facto, é com base
neste artigo que a Agravante sustenta o seu inconformismo, invocando-o no
artigo 7º das suas alegações de fls. 101-104 que “o Tribunal a quo ao
proceder como procedeu, comprometeu a função da citação por não permitir a
apelante de munir-se de elementos que são necessários a sua defesa, e violou o
princípio do contraditório consagrado no nº 3, do art. 3º do CPC, pelo que deve
ser considerada nula a citação, ao abrigo do nº 1 do art. 198º, do C.P.C.”
No seguimento e para bem sedimentar
este entendimento de que a pretendida nulidade da citação é a prevista nos
termos art. 198º do C:P.C., está a
alegação da Agravante de fls. 101-104, no seu artigo 6º onde fez constar
que “no acto da citação à fls. 46
dos autos, lhe foi entregue apenas a petição inicial sem as cópias dos
documentos e peças do processo relacionados com os factos para deles se
pronunciar e preparar convenientemente a sua defesa”.
Isto posto, cumpre dar resposta à
questão colocada, de saber se a arguição da nulidade da citação foi feita
tempestivamente.
Como
já referimos, a nulidade da citação, nos moldes em que é apresentada pela
Agravante, só pode ser arguida no prazo da contestação, nos termos do nº 2 do
art. 198º do C.P.C.
Decorre
dos autos que a Ré foi citada no dia 11 de Julho de 2018, conforme certidão de
fls. 47. E foi-lhe indicado o prazo de 30 (trinta) dias para contestar.
É
dentro deste prazo de 30 dias, contados da citação, certificada no dia 11 de
Julho de 2018, que a Ré deveria ter arguido a nulidade da citação por
alegadamente não lhe terem sido entregues os documentos que acompanharam a
petição inicial.
Ora,
tal prazo terminou no dia 10 de Agosto de 2018, numa Sexta-feira.
Desde
o dia em que terminou o prazo para contestar, 10 de Agosto de 2018, só no dia
24 de Maio de 2021, data de entrada das alegações de recurso de fls. 101-104, é
que a Agravante veio arguir a nulidade da citação invocando a falta de entrega
dos documentos que acompanharam a petição inicial.
Do
dia 10 de Agosto de 2018, data em que terminou o prazo para contestar e para
arguir a nulidade, ao dia 24 de Maio de 2021, data em que a arguição foi feita,
decorreram seguramente 1.018 (Mil e Dezoito) dias. A arguição não foi feita
tempestivamente.
Mesmo
que, por hipótese, se entendesse que a alegada irregularidade deve ser
entendida como sendo a prevista e descrita nos termos dos artigos 194º e 195º
do C.P.C., ainda assim ter-se-ia de concluir pela mesma solução, a de que a
arguição não foi feita tempestivamente.
Senão,
vejamos: o artigo 196º do C.P.C., com a epígrafe “suprimento da nulidade da
falta de citação” dispõe que “se o réu ou o Ministério Público intervir no
processo sem arguir logo a falta da sua citação, considera-se sanada a nulidade”.
Assim,
é de se questionar em que momento é que a Ré, ora Recorrente, interveio no
processo pela primeira vez? Conforme
dado por provado, e como bem revelam os autos, a Ré interveio nos autos:
1º.
“No dia 29 de Julho de 2020, a Ré juntou aos autos
procuração forense em que constitui mandatário judicial – fls. 76-77.”
2º.
“E no dia 7 de Outubro de 2020, a Ré veio interpor
recurso de agravo – fls. 81.”
Nessas
suas intervenções, verificadas nos dias 29 de Julho de 2020 e 7 de Outubro de
2020, a Ré não arguiu logo a nulidade da sua citação.
Com
isso, a eventual nulidade da citação ter-se-á de considerar sanada, ao abrigo
do disposto no art. 196º do C.P.C.
No
caso dos autos, só no dia 24 de Maio de 2021, no momento da apresentação das
suas alegações de recurso, é que a Ré veio suscitar a questão da alegada
nulidade da citação. Esta conduta não pode significar que tenha arguido logo a
nulidade da citação.
Poder-se
ia discutir se deveria arguir a alegada nulidade logo no momento em que juntou procuração,
29 e Julho de 2020, ou se no momento em que deu entrada do seu requerimento de
recurso – 7 de Outubro de 2020.
Como
intervenção principal e substancial, na melhor das hipóteses, a arguição da
nulidade da citação, exigindo-se que seja logo no momento da sua primeira
intervenção, deveria ter sido feita, o mais tardar, no dia 7 de Outubro de
2020, data de interposição do recurso.
De
7 de Outubro de 2020, data interposição de recurso, a 24 de Maio de 2021, data
da apresentação das alegações de recurso com arguição da nulidade da citação,
decorreram, seguramente, 229 dias.
Mesmo
por essa via, a arguição é também extemporânea.
Assim
sendo, em jeito de conclusão diremos sempre que a arguição da nulidade da
citação não foi tempestiva.
A
prática de acto judicial está sujeita a prazos que podem ser dilatórios ou
peremptórios.
O
decurso do prazo peremptório extingue o direito de praticar o acto (no caso, arguir
a nulidade da citação por falta de entrega de documentos que acompanharam a
petição inicial) – art. 145º, nº 3, do C.P.C.
Com
a solução dada à primeira questão, fica prejudicado o conhecimento das outras
questões – art. 660º, nº 2 e 713º, nº 2, do C.P.C.
V
– DECISÃO
Nestes
termos e por estes fundamentos, os Juízes da 2ª Secção da Câmara do Cível do
Tribunal da Relação do Lubango, reunidos em conferência, em nome do povo,
acordam em não dar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a
decisão recorrida.
Custas
pela Agravante, com o mínimo de procuradoria.
Lubango,
22 de Junho de 2022
Bartolomeu Hangalo
Marta Marques
Domingos Nahanga