Processo
013/2023
Relator
Dra. Marilene Camate
Primeiro Adjunto
Dr. Lourenço José
Segundo Adjunto
Dra. Tânia Brás
Descritores:
Acórdão. Recurso de Agravo. Providência Cautelar Não Especificada. Nulidade do processo por ineptidão da petição inicial.
A petição inicial, para ser uma peça bem elaborada e construída, deve ter a contextura lógica dum silogismo, deve poder reduzir-se, em esquema, a um raciocínio, com a sua premissa maior (razões de direito), a sua premissa menor (fundamento de facto) e a sua conclusão (pedido).
Quem subscreve uma petição, advém do nome, desenvolve uma pretensão e conclui por um pedido.
O art.º 467. º do C.P.C ao indicar os requisitos da petição inicial, impõe que o autor exponha os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção, e formule o pedido com precisão e clareza.
A exacta formulação do pedido é determinante, pois o tribunal só conhece daquilo que se lhe pede e na medida em que se lhe pede. Sem pedido, o juiz não tem condições de saber o que pretende o autor.
Assim é entendimento que se está diante da falta de um pressuposto processual relativo ao objecto da causa, cuja a falta origina a excepção dilatória prevista no art.º 288.º b), de tal ponto grave que gera a nulidade de todo o processo, conforme o previsto no art.º 193.º nº 1 CPC.
A falta de formulação do pedido, traduzindo-se na falta do objecto do processo, constitui nulidade de todo ele por ineptidão da petição inicial, o mesmo acontecendo quando, embora aparentemente existente, o pedido ou a causa de pedir é referido de modo tão obscuro que não se entende qual seja ou a causa de pedir é referida em termos tão genéricos que não constituem a alegação de factos concretos.
Processo:
013/2023
Relator:
Desembargador Marilene Camate.
Data
do acórdão: 25 de Maio de 2023.
Votação:
Unanimidade.
Meio
processual: Agravo.
Decisão: Nulidade
do processo por ineptidão da petição inicial.
Palavras-chaves: Ineptidão
da Petição Inicial;
Sumário
do acórdão.
I- A petição inicial, para ser uma peça
bem elaborada e construída, deve ter a contextura lógica dum silogismo, deve
poder reduzir-se, em esquema, a um raciocínio, com a sua premissa maior (razões
de direito), a sua premissa menor (fundamento de facto) e a sua conclusão
(pedido).
Quem subscreve uma petição, advém do nome,
desenvolve uma pretensão e conclui por um pedido.
O art.º 467. º do C.P.C ao indicar os
requisitos da petição inicial, impõe que o autor exponha os factos e as razões
de direito que servem de fundamento à acção, e formule o pedido com precisão e
clareza.
A exacta formulação do pedido é
determinante, pois o tribunal só conhece daquilo que se lhe pede e na medida em
que se lhe pede. Sem pedido, o juiz não tem condições de saber o que pretende o
autor.
Assim é entendimento que se está diante da
falta de um pressuposto processual relativo ao objecto da causa, cuja a falta
origina a excepção dilatória prevista no art.º 288.º b), de tal ponto grave que
gera a nulidade de todo o processo, conforme o previsto no art.º 193.º nº 1
CPC.
A falta de formulação do pedido, traduzindo-se
na falta do objecto do processo, constitui nulidade de todo ele por ineptidão
da petição inicial, o mesmo acontecendo quando, embora aparentemente existente,
o pedido ou a causa de pedir é referido de modo tão obscuro que não se entende
qual seja ou a causa de pedir é referida em termos tão genéricos que não
constituem a alegação de factos concretos.
Os
Juízes da 1ª secção da Camara do Cível, Contencioso Administrativo, Fiscal
Aduaneiro, Trabalho, Família e Justiça Juvenil do Tribunal da Relação do
Lubango, acordam em nome do Povo:
I.
RELATÓRIO.
Na
sala do Cível, Administrativo, Família e Trabalho, do Tribunal da Comarca do
Cuanhama, Requerente. A, titular do
NIF (…), com sede no Bairro (…), em Ondjiva, Província do Cunene,
representada pelos seus mandatários legais intentou a Providência Cautelar Não Especificada contra (…), representado pela senhora Requerida. B, na qualidade de (…),
aduzindo, para tal, os seguintes fundamentos:
1-
A
Requerente. A tem em sua posse (1) uma
escavadeira hidráulica giratória, (1) uma pá-carregadeira, (1)uma retro
escavadeira, (1)uma bulldozer, (1)um cilindro compactador rolo liso, (1)uma
motoniveladora, (1) camião basculante, (1) um camião cisterna de combustível ,
(1) um camião cisterna de Água, (1) um camião porta maquinas e (1) um trailer
reboque, resultante de um contrato de cedência e uso de uma brigada mecanizada
de construção civil, celebrado com o XXXXXX.
2-
O
XXXXXX é titular e legitimo
proprietário dos equipamentos em causa.
3-
Em
12 de Fevereiro de 2021, o referido equipamento havia sido apreendido por
agentes do Serviço (…).
4-
A
mandatária Judicial da Requerente. A
foi informada por telefonema que recebera do XXXXXX um despacho sobre a restituição dos equipamentos ao Requerido. B.
5-
No
dia 15 de Novembro de 2019, o XXXXXX
e a Requerente. A celebraram um
contrato de cedência.
6-
A
anulação do contrato não se efectivou pelo facto de o Requerido. B ter ressalvado e orientado a seguir a efetivação do
contrato com a Requerente. A.
7-
Foi
o próprio Requerido. B, quem
notificou a Requerente. A, para ir a
Luanda, no sentido de recepcionar o equipamento e as respectivas chaves.
8-
A
Requerente. A, não seria capaz de
ter em sua posse de forma indevida os referidos equipamentos por um período de
mais de um ano, sob olhar atento XXXXXX
e do Requerido. B.
9-
A
Requerente. A, realizou obras e
empreitadas para o Requerido. B, e
ainda não pagas, o que não seria possível se não existisse tal contrato.
10-
Não
corresponde a verdade que o Requerido. B,
é titular dos bens equipamentos em causa, como bem se quer fazer crer.
11-
A
Requerente. A, vê o seu direito
sobre o equipamento acima descrito, gravemente ameaçado pela requerida.
Termina
dizendo que:
-
Deve o presente requerimento ser recebido.
-
Na sequência da normal tramitação, seja decretada sem a audição da Requerente. A, para não comprometer a
finalidade da presente providência cautelar.
Juntou
procuração forense e documentos de fls.7 a 19 dos autos.
A
fls. 22 proferiu o despacho de citação.
Devidamente
citado veio o Requerido. B a fls. 25
e 29 defender-se por impugnação
e
por excepção:
1-
Requerido. B, mediante a credencial
NºXXXXXXX, autorizou o senhor (….), então chefe de departamento de
logística e património da Secretaria geral do Requerido. B, a receber do XXXXX
um kit de equipamentos pesados composto por 1 Bulldozer (D6R6), 1 Bulldozer
(D3K2), 1 Motoniveladora, 1 Retroescavadora, 1 pá-carregadora, 1 Escavadora, 1 Cilindro
compactador, 1 Camião Cisterna de água, 1 Camião Reboque (Trailer) e 1 Toyota
Land Cruiser.
2-
No dia 08 de Agosto de 2019, os equipamentos foram recebidos tendo como destino
a constituição de Brigada de Construção Civil.
3-
Informa-se no mesmo Termo de entrega que, no destino, o mesmo deveria merecer a
confirmação da recepção por sua excelência Senhor Requerido. B, curiosamente está confirmação não aconteceu.
4-
No entanto, os equipamentos foram parar no estaleiro da Requerente. A, sem saber ao certo como foram até lá, tendo em conta
o disposto acima no articulado 2°. Da presente contestação.
5-
O contrato foi anulado no dia 17 de Dezembro de 2019, um mês depois de sua
celebração, mediante o despacho n° XXXXX,
de sua Excelência XXXXX, anulação
esta do conhecimento da Requerente. A,
representada pelo senhor (….),
porque assinou a notificação no dia 18 de Dezembro de 2019.
6-
Nos dias 27 e 29 de Abril de 2021, os equipamentos foram restituídos ao Requerido. B.
7-
O XXXXX não tinha legitimidade, para
contratar validamente com a empresa Requerente.
A sobre os equipamentos, que a data dos factos, estavam na posse do Requerido. B.
8-
Há um vício na formação do contrato em causa que compromete a
validade
do negócio jurídico.
Termina
pedindo que:
-
Seja recebida e provada a presente contestação;
-Seja
considerada procedente a impugnação e a defesa por excepção peremptória e, por
conseguinte, indeferir a presente Providência Cautelar não Especificada.
Junta
documentos de fls.30 a 38 dos autos.
Foi
realizada a audiência com vista a produção de prova a fls. 45 e 46.
Foram
os autos com vista ao Digno Magistrado do Ministério Público, fls.50
Conclusos
os autos, foi proferido despacho a fls. 56, a julgar improcedente a presente
providência cautelar.
Notificada
do despacho, inconformada, a Requerente.
A interpôs recurso que foi admitido como sendo de agravo, com subida imediata,
nos próprios autos com efeito suspensivo fls.63.
O
recorrente, veio juntar aos autos as alegações de recurso de fls. 68 a 75,
formulando as seguintes conclusões:
1- É
facto que a recorrente, tem em sua posse um Contrato de Cedência e uso de uma
Brigada Mecanizada de Construção Civil, celebrado com XXXXX, em 15 de Novembro de 2019.
2- Também
é facto que, a pretensão da anulação do referido contrato foi ultrapassado pelo
Requerido. B cessante.
3- É
facto que a recorrente, realizou obras e empreitadas a pedido do Requerido. B, sem quaisquer
dificuldades, ainda não pagas até a presente data.
4- A
recorrente, não só realizou obras e empreitadas na vigência do Requerido. B cessante, como na vigência
da actual Requerida. B, inclusive
inauguradas pubicamente (acto público), depois da sua apresentação como sendo a
empresa detentora do contrato e para o cumprimento da disposição constante na
al.b) da clausula 10° do respectivo contrato.
5- E
facto ainda, que aquele contrato de cedência e uso de uma brigada mecanizada de
construção civil, não foi mais celebrado com nenhuma outra empresa, a não ser
com a recorrente.
6- E
facto que a titularidade dos equipamentos em causa é do XXXXX, sendo que o Requerido.
B não tem legitimidade para anular o contrato em referência.
7- E,
mesmo que houvesse algum litígio, é competente o Tribunal Provincial de Luanda,
com a expressa renúncia a qualquer outro, nos termos da clausula 20ª do
respectivo contrato.
8- Além
de que, o valor do contrato em referência, excede alçada do Tribunal de
Comarca.
O
Juiz da causa proferiu o despacho de sustentação de fls. 106 e 109.
Remetido
ao Tribunal "ad quem" o recurso foi aceite como próprio, interposto
atempadamente e com legitimidade.
Contra-alegando a fis. 141 a 144,
veio o agravado apresentar, em suma, as seguintes conclusões:
1- Face ao exposto,
dúvidas não existem relativamente a aparência do direito a que a Agravante se
arroga possuir;
2- A agravante não provou
a existência o justo receio de que alguém venha praticar actos capazes de lhe
provocarem lesão grave e de difícil reparação ou perigo na demora;
3 - A agravante tinha a
obrigação legal de fazer prova de ambos requisitos aquando da apresentação do
seu requerimento inicial;
4- Os requisitos acima
referidos são de aplicação cumulativa nas providencias cautelares;
5- Por apenas ter feito
prova de um requisito, a solução legal é justamente o não decretamento da
providência cautelar, tal como fez o Tribunal " A quo" nos termos da decisão recorrida;
6- A decisão recorrida deve ser
mantida, pois declarou apenas a não verificação dos requisitos legais exigidos
pelos artigos 399,400º e 401° todos do C.P.C.
Termina
pedindo que:
-
O presente recurso seja declarado improcedente.
-
Seja mantida os termos da decisão recorrida.
Colheram-se
os vistos legais a fls.152 e 152 verso.
II.
OBJECTO
DE RECURSO
Sendo
âmbito e objecto do recurso delimitados; para além das meras razões de direito
e das questões de conhecimento oficioso; pelo inserto nas conclusões das
alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 660° n° 2, 684° e 690°, n° 1°, todos do C.P.C;
No
caso em concreto, existe uma questão de conhecimento oficioso relacionada com
uma excepção dilatória (ineptidão da petição inicial), que obsta ao
conhecimento do objecto do recurso, nos termos dos arts. º 704.º nº 1 e 749º
CPC.
III.
QUESTÃO PRÉVIA
Remetido
os autos a esta instância cabe apreciar a existência dos pressupostos
processuais necessários para a procedência da acção.
Verifica-se que a agravante em sede
da petição inicial, não concretiza o pedido, apenas vem dizer o seguinte:
- "Deve o presente requerimento
ser recebido".
-
"Na sequência da normal tramitação,
seja decretada sem a audição da requerida, para não comprometer a finalidade da
presente providência cautelar”
Analisando:
Petição
inicial é o articulado em que se propõe uma acção, formulando um pedido e
expondo os respectivos fundamentos de facto e de direito.
No
dizer de Hélder Martins Leitão in Dos
Actos Processuais (o tempo, o modo, a forma), "a petição inicial, para ser uma peça bem elaborada e construída,
deve ter a contextura lógica dum silogismo, deve poder reduzir-se, em esquema,
a um raciocínio, com a sua premissa maior (razões de direito), a sua premissa
menor (fundamento de facto) e a sua conclusão (pedido)”.
Quem subscreve uma
petição, advém do nome, desenvolve uma pretensão e conclui por um pedido.
O art.° 467.° CPC
ao indicar os requisitos da petição inicial, impõe que o autor exponha os
factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção, e formule o
pedido com precisão e clareza.
O que no caso sub
judice não acontece, pois o autor (requerente), não conclui a petição inicial
com um pedido, dizendo apenas que deve o presente requerimento ser recebido e
na sequência da normal tramitação, seja decretada sem a audição da requerida,
para não comprometer a finalidade da presente providência cautelar, não
contendo, como deveria, a formulação do pedido que se circunscreve na expressão
de vontade do autor de ver o tribunal a exercer a sua actividade, em ordem à
emissão de uma sentença de mérito como bem referiu o juiz a quo na sentença
recorrida.
A exacta
formulação do pedido é determinante, pois o tribunal só conhece daquilo que se
lhe pede e na medida em que se lhe pede. Sem pedido, o juiz não tem condições
de saber o que pretende o autor.
Se não vejamos:
O facto de o autor
não ter formulado o pedido, requisito indispensável da acção, dá lugar a
ineptidão da Petição Inicial, nos termos do art.º 193.º nº 2 CPC.
Assim é
entendimento que se está diante da falta de um pressuposto processual relativo
ao objecto da causa, cuja a falta origina a excepção dilatória prevista no
art.º 288.º b), de tal ponto grave que gera a nulidade de todo o processo,
conforme o previsto no art.º 193.º nº 1 CPC.
"A falta de formulação do pedido, traduzindo-se
na falta do objecto do processo, constitui nulidade de todo ele por ineptidão
da petição inicial, o mesmo acontecendo quando, embora aparentemente existente,
o pedido ou a causa de pedir é referido de modo tão obscuro que não se entende
qual seja ou a causa de pedir é referida em termos tão genéricos que não
constituem a alegação de factos concretos". José Lebre de Freitas, in A Acção
Declarativa Comum, Á Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3ª edição.
O
juiz a quo, não a indeferiu liminarmente nos termos do art.° 474.° n.° 1 a) C.P.C,
e podendo faze-lo na sentença também não o fez, apesar de ter feito e muito bem
referência na sentença recorrida sobre a falta de pedido na petição inicial, só
não concluiu com a cominação legal, da falta de pedido que configura inaptidão
da petição inicial e tem como consequência a anulação de todo processo.
Outrossim:
A
produção dos efeitos da excepção acima referida, não está dependente da
arguição do réu, pois a ineptidão da petição deve ser oficiosamente conhecida
pelo tribunal, nos termos 202.º CPC.
Assim
o facto de o agravante não ter formulado pedido, ou seja, não dizer que
providência quer ver o Tribunal tomar para acautelar o seu direito violado ou a
ser violado, e porque a formulação do pedido é um ponto fundamental de
referência para a sentença, entende-se inepta a petição e, consequentemente
declarar a nulidade de todo processo nos termos do art.º 193. nº 1 do CPC.
IV. DECISÃO:
Nestes termos e fundamentos, acordam os juízes desta
Câmara do cível em negar provimento ao recurso, e em consequência declara nulo todo
o processo, por ser inepta a petição inicial.
Custas pela
agravante com taxa de justiça que se fixa em ½.
Registe e
Notifique
Lubango, 25 de
Março de 2023.
Os juízes
Desembargadores
Marilene Camate
Lourenço José
Tânia Brás